quarta-feira, 3 de fevereiro de 2016


Para os cidadãos da Grécia antiga os “três grandes” poderiam significar Poseidon, Zeus e Hades, mas para aqueles que viveram e testemunharam o arrasador século XX, eram as imagens de Churchill, Roosevelt e Stalin que simbolizava a figura das três maiores potencias de sua época. Na obra “Os três Grandes”, Jonathan Fenby esmiúça a relação entre os três lideres que estavam à frente da maior coalizão armada da historia. Em um texto extraordinariamente bem escrito e amparado por vasta documentação histórica, vemos a narrativa oscila das questões diplomáticas para os dramas particulares de cada um dos três ícones da historia mundial.
Durante exatos 2174 dias esses três homens – exceto Roosevelt que morreria poucos meses antes do fim do conflito - suportaram a tensão imposta pelo maior acontecimento do século XX. Foram responsáveis por conduzir a maior mobilização de massas da historia, provocaram uma intensa mecanização e um salto tecnológico gigantesco. Para Fenby os verdadeiros protagonistas no cenário político foram Roosevelt, Stalin, Churchill e Hitler. Mussoline, Mão Tse Tung, Chiang Kai-Shek, Charles de Gaule, Tojo e Hiroito compunham o elenco de apoio.
Ocorreram apenas duas reuniões entre os três lideres, e ambas próximas do território soviético. Fenby explica que esse pouco contato entre os representantes da mais importante coalizão militar do ultimo século se deveu ao medo de Stalin de voar. Quando a aliança entre os três se formou, Churchill já estava com sessenta e sete anos, Stalin tinha sessenta e dois e Rossevelt cinquenta e nove. A narrativa de Fenby é ágil, empolgante e não se limita a questões políticas, explorando também o lado humano.
Winston Leonard Spencer Churchill é descrito como o mais impulsivo dos três. Um autêntico produto da sociedade inglesa e do imperialismo vitoriano, muito distante do tradicional gentleman. Descrito como um “grosseirão” de hábitos deploráveis e modos pouco ortodoxos. Sempre com seu charuto a mão era um alcoólatra inveterado. Sua crença exacerbada na suposta superioridade dos anglo-saxões o definia como uma versão inglesa - embora menos genocida – de Hitler. Durante um almoço em Washington, Churchill teria dito ao presidente americano: “Somos superiores.” Foi o líder que mais se movimentou durante a guerra fazendo viagens para a França, através do oceano infestado de submarinos alemães, e até para Moscou.
Roosevelt era a síntese dos Estados Unidos: um aristocrata populista que resgatou o país da grande depressão após o colapso financeiro de 1929. Foi o único dos três a frequentar uma universidade. Como homem político Roosevelt é descrito como um manipulador, visionário e determinado. Como pessoa surge como um homem egoísta, inescrupuloso e desconfiado. Apesar da fachada carismática do líder americano o mesmo possuía uma natureza dominada por um ostracismo singular. Era avesso a qualquer forma de intimidade com terceiros e plenamente convencido de suas capacidades intelectuais. Harry Truman, que assumiu a presidência após a morte de Rossevelt, o descreveu como o “homem mais frio que já conheci.”
Iosef Vissarionovich Djungashvili, ou simplesmente Stalin, aparece como o rústico “urso” soviético. De origem humilde, Stalin era filho de um sapateiro alcoólatra com uma lavadeira. Um ex-seminarista que durante a juventude roubava bancos para financiar o partido de Lenin. Segundo Fenby, Stalin foi um homem que havia se reinventado - mudará seu próprio nome e a sua data de nascimento – e que assumiu o comando de um país rural e o converteu em uma super potencia nuclear. Sua praticidade e desprezo pela vida fizeram dele um dos maiores genocidas de todos os tempos. Hitler era apenas um aluno ao seu lado. Averell Harriman o considerava mais realista que Churchill, mais bem informado que Roosevelt e o mais eficaz comandante dos três.
Stalin era um homem baixo, possuía apenas 1,65m, rosto marcado pela varíola, possuía olhos cor de mel e mãos enormes - quase um vilão dos quadrinhos com suas desproporções. A maioria dos que o conheceram notaram seu habito de nunca encarar alguém diretamente nos olhos. Desconfiado e extremamente vingativo era capaz de manter seu ódio por anos e usá-lo posteriormente. Metódico ao extremo Stalin era um burocrata exemplar, possuía uma memória admirável e era mestre em fazer perguntas incisivas que evidenciassem a fraqueza de seus interlocutores. Roosevelte era mais adepto aos textos escritos do que das performances orais. O presidente americano era fascinado por sua coleção de selos - avaliada em 80 mil dólares - e geralmente terminava seus trabalhos antes do jantar, ao contrario de Stalin e Churchill que costumavam trabalhar até as primeiras horas da madrugada. Stalin se levantava as 11 da manha, assim como Churchill que tinha o habito de ler os jornais na cama enrolado em seu roupão multicolorido de algodão. Churchill era um homem mimado, mas de certa forma benevolente, ao contrario de Stalin, que gostava de humilhar seus subordinados em situações regadas a bebidas.
Roosevelt gostava de fazer exercícios, apesar da sua limitação física causada pela Poliomielite. Churchill gostava de trabalhos de alvenaria e pintura, Stalin era apaixonado por jardinagem e se divertia com seus canteiros de rosas e plantações de limões, mas era avesso a pratica de exercícios, principalmente a natação.
Stalin era o típico sujeito manipulador que gostava mais de prestar atenção nas conversas a sua volta do que falar, economizava palavras que talvez por deixarem de ser ditas diziam muita coisa. Churchill falava compulsivamente. Segundo relatos o Primeiro ministro inglês teria falado ininterruptamente em uma reunião de cúpula das oito da noite até uma e meia da madrugada. Roosevelt era divagador nato. Em muitas situações permanecia neutro diante de um debate retórico, permitindo-se apenas uma rápida, às vezes nem tanto, divagação ao final do mesmo onde pesava as considerações de ambas as partes para um consenso final. Era a típica, e calculada imagem do presidente americano no cenário internacional: uma espécie de arbitro das questões diplomática.
Preparar coquetéis era uma das paixões de Roosevelt. Gostava de bebidas suaves, como martinis e outros destilados associados a frutas. Churchill tinha o habito de tomar uísque logo pela manha. No almoço tomava seu costumeiro brandy, no jantar era acompanhado por vinho ou champanhe e antes de dormir tomava mais algumas doses de uísque. Em certa ocasião, na embaixada britânica no Cairo, teria pedido vinho branco para o café da manha logo depois de já ter tomado dois scotchs. Ao regressar do seu primeiro encontro com Roosevelt Churchil teria pedido um licor para acompanha-lo durante o almoço, depois de alguns minutos pediu conhaque. Quando o garçon o lembrou de que já havia pedido o licor em menos de dez minutos o primeiro ministro respondeu: “Eu sei, quero o brandy para limpa-lo.”
Stalin gostava de vinhos georgianos, mas evitava a tradicional vodka. Preferia embebedar as pessoas a sua volta para “soltar-lhes a língua”. Seus grandes banquetes no Kremlin eram regados a bebidas e Stalin incentivava aqueles que o cercava a consumir destilados enquanto ele permanecia com sua dose de vinho diluído em água.
A narrativa se inicia com a descrição do famoso jantar em Teerã, no dia 29 de novembro de 1943, e segue intercalando os dilemas pessoais e as questões diplomáticas enfrentadas pelos três ícones. Fenby foi capaz de envolver os aspectos político – tão maçantes para a maioria dos leitores – com uma linguagem não apenas clara, mas também cativante. Em suas 487 paginas vemos como um dos maiores eventos do século XX culminaria nos temores da guerra fria
AUTOR TIAGO R. CARVALHO
Editora: NOVA FRONTEIRA -
Idioma: PORTUGUÊS
Ano: 2009
Nº de Páginas: 487

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