domingo, 3 de dezembro de 2017

UM NOVO OLHAR SOBRE A NATUREZA: ALEXANDER VON HUMBOLDT POR ANDREA WULF


Todo pensamento racional possui certa medida de irracionalidade. Humboldt foi um dos mais famosos cientistas de seu tempo. Um homem que se dizia amante da natureza. É nesse ponto que se concentra o caráter antagônico do naturalista: a razão, como disse o pensador Max Horkheimer surgiu devido ao desejo do homem de dominar a natureza através da descoberta de suas leis. Como um homem pode pretender dominar algo que ele a principio admira? A resposta está no sentido com que esse mesmo homem define o termo “dominar”.
Alexander Von Humboldt foi um dos mais famosos naturalistas e cientistas de seu tempo. Um homem que foi capaz de associar ciência e poesia na criação de uma ferramenta que lhe torna-se possível desnudar os segredos da natureza e, portanto, dominá-la.
Logo nas primeiras paginas fica evidente a admiração que Andrea Wulf sente por seu biografado. Ela constrói a imagem de um menino inquieto, com certa dificuldade aos estudos e que gostava de perambular pelos bosques e ler narrativas de viagens além mar. O texto é muito fluído é a autora não se prende a uma análise mais criteriosa aos primeiros anos de Alexander Von Humboldt. Em pouco mais de vinte paginas vemos a historia evoluir de um simples menino que gostava de coletar rochas e insetos a um inspetor de minas de 22 anos de idade.
Logo no final da segunda parte o livro sofre uma expressiva melhora em sua narrativa. A relação de Humboldt com Thomas Jeferson - o presidente americano que era apaixonado por agricultura - é uma das partes mais interessantes. É neste trecho da obra que tomamos contato com as opiniões de Humboldt sobre a monocultura e a economia de caráter agroexportadora.
Confesso que durante a leitura parte de minha admiração por Humboldt virou fumaça diante da narrativa de um homem que atirava dardos envenenados em macacos para capturar seus filhotes. A noção de ambientalista do século XIX era bem distante da que temos hoje, mas é realmente chocante ler esse trecho é não se decepcionar com um homem que é conhecido como amante da natureza. E o mais impressionante é que essa passagem é apenas uma nas quais questionamos Humboldt. O trecho sobre os cavalos sendo eletrocutados por enguias também é impressionante. O livro é muito bem escrito, mas acho que a autora tentou contornar certos momentos da história de Humboldt para que pudesse manter a imagem de um ídolo. A própria capa vende a imagem de um “Rousseau alemão”, mas na pratica não era bem assim.
ANDREA WULF
No capitulo 3 temos uma brilhante síntese da ciência iluminista do século XVIII. Andrea Wulf cria uma base narrativa a partir da relação de amizade entre Humboldt e dois ícones do romantismo alemão: Schiller e Goethe. Os três costumavam passar as tardes conversando sobre Newton, Leibnitz, Kant, etc. Goethe é uma figura que se destaca bastante no terceiro capitulo. Sua relação de amizade com Humboldt era bem concreta e de fato vemos como um foi importante para o outro no sentido de incentivar pesquisas em suas respectivas áreas de interesse. A autora descreve de forma bem simples e de fácil assimilação um dos pontos mais complexos de ser explicado que é a polarização da ciência do século XVIII entre Racionalistas e Empiristas.
Foi na America do Sul que Humboldt desenvolveu sua teoria que relaciona às mudanças climáticas a atividade humana. Um ponto interessante levantado pela autora é a preocupação que existia nos séculos XVIII e XIX quanto aos danos provocados pelo desmatamento. O carvão era o motor da revolução industrial e centenas de hectares de florestas eram derrubadas para a produção de carvão vegetal, que apesar de não ser utilizado na grande siderurgia era muito consumido no aquecimento domestico.
A preocupação era obviamente econômica, pois existia o temor de que as reservas de madeira se esgotassem. Mas havia também um movimento ambientalista embrionário que alertava para as alterações climáticas que a exploração predatória poderia acarretar. No século XIX acreditava-se que as doenças eram provocadas por “ar viciado”, ou seja, mau cheiro. É nesse rastro que surgiram homens como Hugh Williamson, medico e político norte americano que defendia o desmatamento alegando que a remoção das arvores melhorava a circulação dos ventos e a qualidade do ar.
A idéia de uma natureza rústica dominada pela razão humana foi defendida pelo famoso naturalista Frances George Lois Leclerc, conde de Buffon. A selva era vista como um ambiente hostil e feio que deveria ser organizado pelo homem como uma prova de sua suposta superioridade sobre a natureza. É deste conceito que surgiu a fascinação francesa pelos jardins simetricamente desenhados, comuns no período do iluminismo.
O projeto gráfico da editora Crítica é absurdamente bem feito: capa dura, fotos de uma qualidade incrível, letras com uma fonte excelente como adorno para um texto gentil, inteligente e interessante. Mais do que uma simples biografia a obra “A invenção da natureza” é um retrato das ciências da natureza do século XIX com uma linguagem cientifica adequada e certa dose de narrativa poética. Vale cada minuto de leitura!
AUTOR
TIAGO R.CARVALHO
A Invenção da Natureza
AUTORA: Wulf, Andrea
Editora: Critica
Numero de Paginas: 600
Ano: 2016

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